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Há 25 anos, quando comecei a estudar ortopedia e traumatologia, fui em busca de um livro-texto que ensinasse os primeiros conceitos teóricos e que desse uma idéia, ao menos parcial, da nossa especialidade. Era um manual de ortopedia e traumatologia semelhante a outros, escrito por autores estrangeiros e traduzido para a língua espanhola. Foi um livro de cabeceira, meu livro-texto quando cursei a disciplina de ortopedia e traumatologia na Faculdade de Medicina – assim como foi para muitos colegas meus, tendo me acompanhado também quando fiz o concurso para residência. Tal motivo fez com que eu o guardasse como um objeto de grande valor sentimental, já que foi o meu primeiro professor de ortopedia e traumatologia.
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Durante a residência, fomos obrigados a investir em livros estrangeiros, que nos ensinavam os problemas da especialidade com detalhes científicos e técnicas usadas em outros países, nem sempre possíveis de serem executadas no Brasil. Os ensinamentos que tínhamos de nossos professores durante a residência misturavam-se com a realidade brasileira, cada uma inerente ao serviço e às condições hospitalares da época, os quais não mostravam a atualidade da ortopedia brasileira como um todo, mas apenas uma mescla do que se fazia naquele determinado hospital e naquele ou naqueles livros texto a que tínhamos acesso. Isso se refletia no exame para obtenção do título de especialista: os examinadores, vindos de regiões e serviços dos mais distintos, assim como os residentes – alguns tendo feito formação inclusive em outros países – tinham idéias e experiências completamente diferentes das que tinham os candidatos.
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Em 1979, assumi a regência da Disciplina e a chefia do Serviço de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina e Hospital Universitário da PUCRS. A partir daí, as posições se inverteram. Os alunos e os residentes buscavam um livro-texto, uma maneira mais apropriada de conhecer a nossa especialidade. Perguntavam que livro era recomendado por nós, professores, e a realidade era a mesma da década de 60 e início de 70, ou seja, tínhamos a indicar alguns livros do tipo manual, escritos por autores estrangeiros, com edições novas, mas desatualizadas, ficando cada vez mais distantes da realidade brasileira.
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Por outro lado, como professores, tínhamos o mesmo problema ao compormos o programa básico teórico da disciplina. Durante as aulas, percebíamos os alunos copiando, gravando as nossas aulas, já que o que ensinávamos nem sempre podia ser encontrado nos livros-texto a que tinham acesso. Isso fazia com que, em vez de prestarem atenção às aulas, gastassem todo o tempo preocupados em copiar a matéria. Nem eles – os estudantes –, nem nós – os professores – estávamos satisfeitos com tal situação.
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Na residência, o programa a ser seguido era mais coerente. A Comissão de Ensino e Treinamento da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia há muito já tinha determinado o programa básico téorico e prático a ser desenvolvido pelas residências por ela credenciadas. Mas o problema dos livros-texto continuava. Eram inacessíveis – pelo preço – e difíceis de serem entendidos por serem escritos em língua estrangeira. A prática do livro copiado em xerox tomou contadas nossas faculdades e residências, uma prática ilegal, com perda substancial da qualidade das imagens radiográficas, que na cópia perdem os detalhes, mas que tem sido a maneira mais economicamente viável de acesso ao conhecimento nos nossos dias.
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A subespecialização fez surgir ao longo destes anos um número crescente de livros e publicações específicos para cada área, o que aumentou ainda mais a necessidade de acesso do residente aos conhecimentos que serviram de base para os grupos especializados, que hoje temos em todos os serviços de ortopedia no Brasil e no exterior. E o quadro encontrado é composto por poucas instituições que ainda conseguem manter uma biblioteca com revistas e livros atuais e especializados.
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De 1988 a 1993, estive envolvido com o ensino da especialidade em nível de residência, participando da Comissão de Ensino Continuado e, depois, da Comissão de Ensino e Treinamento da SBOT. Discuti com os colegas de comissão todos esses aspectos, inclusive o fato de que, com exceção da nossa Revista Brasileira de Ortopedia e Traumatologia, que é o espelho das nossas atividades científicas e do nível da ortopedia brasileira, nenhuma outra publicação ou livro de autores brasileiros é indicado oficialmente como livro-texto recomendado como fonte de pesquisa para o exame da CET/SBOT.
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A direção da Artmed Editora, apoiada na realidade desses fatos, mostrou-nos a mesma ansiedade e preocupação em relação ao vazio literário, no Brasil, de uma obra que fosse nacional, escrita por colegas brasileiros, baseada em uma experiência que é a nossa realidade e não a de outros países, que pudesse reunir assuntos básicos e temas referentes às várias subespecialidades e que fosse acessível ao aluno e ao residente. Tais questões foram o motivo do convite para que eu organizasse esta obra.
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Temos a intenção de que este livro sirva para consultado ortopedista geral e daquele que, ao se dedicar mais a uma subespecialidade, não tem muito tempo para acompanhar o avanço científico das outras áreas. Que sirva ao residente como um livro-texto básico, que mostre a tendência da ortopedia e da traumatologia brasileiras vivida pela realidade dos nossos ortopedistas, em especial os familiarizados com os conceitos e as práticas mais atuais. Que possa servir como guia para o concurso ao título de especialista e seus primeiros anos como profissional. Que o estudante de medicina, ao cursar a disciplina de ortopedia e traumatologia, possa ter o material necessário para o estudo da especialidade, sem se preocupar em buscar em várias publicações o que pretendemos esteja reunido neste livro.
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Sem o convite e o patrocínio da Artmed Editora, a cada dia mais envolvida com temas da nossa especialidade, sem a aceitação e o material produzido por todos os autores colaboradores, sem a parceria do professor Renato Xavier na definição dos temas propostos e na escolha dos autores, este livro não seria realidade. A todos eles eu agradeço e presto a minha homenagem.
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Aos que contribuíram para o meu aprendizado – professores, assistentes, alunos e pacientes – agradeço retribuindo com parte de minha experiência e a de todos os autores desta obra.
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Este não é o primeiro livro escrito por autores nacionais, mas com certeza é o mais atual e abrangente da especialidade.
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Sizínio Hebert
Organizador